
Neste ano, no dia 31 de outubro, celebramos o 506º aniversário da Reforma Protestante. No entanto, podemos nos questionar se estamos realmente celebrando a Reforma Protestante ou, mais precisamente, a Reforma Luterana.
Após o evento de 31 de outubro de 1517, várias denominações cristãs surgiram e adotaram o termo “protestante” para se autodefinirem. Mas quando e como surgiu este termo? E a quem ele foi originalmente aplicado?
Para compreender a origem do termo “protestante”, é necessário voltar um pouco na história, principalmente à época da Dieta de Augsburgo em 1530 onde os luteranos apresentaram sua Confissão de Augsburgo, um documento de grande importância.
Naquela época, o imperador Carlos V, sem dúvida, desejava estabelecer a unidade dentro de seu vasto império. Após eventos como a revolta dos camponeses na década de 1520, tornou-se evidente que os príncipes precisavam se unir para preservar sua posição no interior do império. Além disso, era imperativo que o próprio imperador liderasse uma frente unificada para lidar com a ameaça dos turcos, que não apenas inquietavam o Mediterrâneo oriental, mas também avançavam pelo Danúbio, chegando à iminência de atacar Viena no final da mesma década. O imperador também se envolveu em conflitos com a França, com muitos desses embates ocorrendo na Itália, nos quais o Papa e os estados papais também desempenharam um papel. Portanto, a busca pela unidade era uma prioridade para o imperador.
No entanto, a Reforma representava, em certa medida, uma ameaça a essa unidade. Como resultado, ocorreram uma série de reuniões conduzidas pelo próprio imperador ou seus representantes com os líderes dos diversos territórios políticos que compunham seu império. Essas reuniões eram conhecidas como Dietas. A Dieta de 1530 foi uma dessas reuniões, mas antes disso, encontros anteriores já haviam abordado questões religiosas e divisões de crenças.
Um exemplo é a Dieta realizada em Spire, no Sacro Império Romano, em 1526, na qual as questões religiosas desempenharam um papel de destaque.
Devido à imperativa necessidade do imperador de estabelecer uma frente unificada, seus representantes demonstraram uma predisposição para realizar concessões aos evangélicos. Em particular, a Dieta de Spire chegou a um consenso unânime quanto ao Edito de Worms que foi um documento que originalmente

declarava Martinho Lutero como herege e fora da lei, e proibia que ele encontrasse refúgio em qualquer parte da Alemanha. No entanto, a Dieta decidiu que esse Edito não seria aplicado em nível imperial, mas sim dentro dos territórios e sob a jurisdição das autoridades locais. Em termos mais claros, cada príncipe territorial e cada cidade imperial receberam a autoridade para determinar como esse decreto seria implementado em seus territórios, pelo menos até a convocação de um Concílio Geral da Igreja, responsável por deliberar sobre essas questões de forma definitiva.
Essa decisão representou uma boa notícia para os evangélicos, uma vez que lhes conferia a autonomia para optar por não aplicar o Edito de Worms em seus respectivos territórios. Assim, o ano de 1526 marcou o surgimento de um princípio de importância no âmbito do Sacro Império Romano, quem em poucas palavras, dizia: “a religião do governante é a religião da região". Isso significava que cada território tinha a liberdade de determinar qual seria a religião predominante em sua jurisdição. Esse princípio teve seu início na primeira Dieta de Spire, em 1526, e desempenhou um papel significativo na evolução religiosa do império.
Em poucos anos, houve uma notável transformação na situação, particularmente em relação ao imperador. Por um lado, ele obteve uma vitória decisiva sobre os franceses nas Guerras Italianas no final da década de 1520. Em 1529, os franceses estavam dispostos a conceder concessões e assinar um tratado de paz com o imperador. Contudo, na segunda realização da Dieta de Spire, em 1529, os representantes do imperador, notadamente seu próprio irmão, Fernando, não estavam mais inclinados a fazer concessões aos evangélicos, ou seja, aos príncipes e territórios luteranos. A maioria da Dieta revogou as disposições da Dieta anterior e determinou que o Edito de Worms deveria ser aplicado em todo o império, independentemente da vontade ou ação dos governantes locais.
Essa decisão desencadeou um debate intenso e levou a um protesto formal por parte de vários príncipes e representantes das cidades imperiais. Foi como resultado desse protesto que esse grupo passou a ser historicamente conhecido como

“Protestantes”, devido à sua objeção à decisão da segunda Dieta de Spire de fazer cumprir o Edito de Worms contra Martinho Lutero e seus seguidores. Durante todo esse período, a religião se mostrou um fator divisivo dentro do contexto do Sacro Império Romano.
Dessa forma, torna-se evidente que o termo "protestante" em 1529 era um adjetivo utilizado especificamente em referência aos evangélicos luteranos e não abrangia outras denominações que emergiram após a Reforma. Em resumo, a designação "protestante" estava vinculada aos luteranos.
Ainda assim, a dúvida pode persistir: Reforma Luterana ou Reforma Protestante? Conforme dito acima, o termo “protestantes” se refere aos luteranos. No entanto, é importante observar que esse termo surgiu somente em 1529. Por outro lado, o evento comemorado em 31 de outubro remonta à intenção de Martinho Lutero de iniciar um diálogo com a igreja a respeito dos inúmeros erros doutrinários. Em 31 de outubro de 1517, ele afixou as suas 95 teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg. Portanto, a conclusão que podemos tirar é que o termo mais apropriado para se referir a esse acontecimento é a “Reforma Luterana” e não a “Reforma Protestante”.
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