top of page

VEM, SENHOR JESUS: Origem e significado da Oração da Mesa

Foto do escritor: Rev. Filipe Schuambach LopesRev. Filipe Schuambach Lopes


Como cristãos e especialmente como luteranos, oramos a “Oração da Mesa” antes das refeições. Aprendemos isso ainda crianças, ao orarmos em nossas mesas em casa, em restaurantes ou ao participarmos de alguma refeição na igreja. Nossos avós e bisavós costumavam orar em alemão. Claro, a oração poderia variar de família para família, mas geralmente, a “Oração da Mesa” era a seguinte:

Komm, Herr Jesu; sei unser Gast; und segne, was du uns bescheret hast. Amen. (Vem, Senhor Jesus, sê o nosso convidado; e tudo o que nos dá, nos seja abençoado. Amém)

Essa breve oração é simples e direta, utilizando palavras fáceis para as crianças e com significado profundo para os adultos. Mas qual é o significado desta oração?
Vem, Senhor Jesus. Quando oramos estas palavras antes das refeições, unimos a nossa voz à do apóstolo João, que orou essas mesmas três palavras perto do final do Apocalipse: “Vem, Senhor Jesus” (Ap 22.20). Jesus voltará novamente no Último Dia. Ansiamos e oramos por aquele dia em que ele aparecerá novamente em carne. Aguardamos ansiosamente o dia em que o contemplaremos face a face, e ele nos levará para passar a eternidade em Sua presença, juntamente com o Pai e o Espírito Santo.
“Vem, Senhor Jesus” não é simplesmente um convite para Jesus aparecer durante a refeição que estamos fazendo. Na verdade, ela projeta a refeição que consumimos à luz da eternidade. “Vem, Senhor Jesus” é o clamor da Igreja para que nosso Senhor Jesus venha até nós com Sua graça, misericórdia e amor. É o apelo da Igreja para que nosso Senhor Jesus venha e corrija a nossa natureza humana, tão contaminada pelo pecado. É o pedido da Igreja para que nosso Senhor Jesus venha e nos conduza à festa das bodas do Cordeiro, que não terá fim (cf. Ap 19.9). “Vem, Senhor Jesus”, oramos, porque sem ele, nossas vidas e nosso futuro são inseguros e sem sentido.
Seja nosso convidado. Aqui, pedimos a Jesus que seja nosso convidado. Quando Jesus se convidou para entrar na casa de Zaqueu, Zaqueu o acolheu, de modo que o povo disse “que Jesus tinha se hospedado com um homem pecador” (Lucas 19.7). Os dois discípulos no caminho para Emaús imploraram a Jesus: “Fique conosco, porque é tarde, e o dia já está chegando ao fim” (Lucas 24.29). Quando convidamos Jesus para ser nosso convidado, é simplesmente uma resposta que brota da fé. Pedimos e ele que seja nosso convidado porque sabemos que ele – com o Pai e o Espírito Santo – nos provê comida e bebida e tudo o mais que precisamos para sustentar nosso corpo e vida. Pedimos que ele seja nosso convidado porque queremos que ele venha e diga o que disse sobre Zaqueu: “hoje houve salvação nesta casa” (Lucas 19.9). Pedimos que ele seja nosso convidado porque queremos lembrar tudo o que ele fez por nós. Não é diferente de orar: “O pão nosso de cada dia nos dá hoje”, que é orar para que recebamos o pão nosso de cada dia com ação de graças. “Seja nosso convidado”, pedimos ao nosso Senhor Jesus, porque o Espírito Santo nos ensinou que Jesus traz salvação à casa que o recebe com fé.
E tudo o que nos dá, nos seja abençoado. Quer a mesa da refeição seja rica ou pobre, abundante ou escassa, tudo o que nós temos e recebemos é uma dádiva de Deus, e queremos que o nosso Salvador a abençoe. Como diz em Hebreus:
“porque a terra que absorve a chuva que frequentemente cai sobre ela e produz plantas úteis para aqueles que a cultivam recebe bênção da parte de Deus” (Hebreus 6.7).
Tudo o que nosso Senhor abençoa alcança o propósito para o qual ele o deu. Quando nosso Senhor abençoa a comida em nossas mesas, ela faz o seu trabalho: alimenta e nutre nossos corpos para que possamos adorar a Deus e servir ao próximo. Isso acontece sempre que Jesus abençoa o pão no Novo Testamento. É o que aconteceu na multiplicação dos pães e dos peixes, onde Jesus,
“tendo mandado que a multidão se assentasse sobre a relva, pegando os cinco pães e os dois peixes, erguendo os olhos para o céu, os abençoou. Depois, tendo partido os pães, deu-os aos discípulos, e estes deram às multidões” (Mateus 14.19-20).
Nosso Senhor abençoou o pão e ele alimentou a todos. Nosso Senhor abençoa aquilo que colocou em nossa mesa, e estes nos alimentam. E, tendo recebido a dádiva do alimento de nosso Senhor, voltamos às atividades da vida nutridos e preparados para servir aqueles que nos rodeiam.
“Vem, Senhor Jesus”, clamamos com a Igreja, ansiando que nosso Senhor retorne em glória e nos salve deste mundo pecaminoso. “Seja nosso convidado”, pedimos-lhe, sabendo que a casa que recebe Jesus na fé recebe a sua salvação. “E tudo o que nos dá, nos seja abençoado”, oramos, confiando que a comida em nossas mesas será suficiente para nos nutrir para realizarmos o trabalho que o Senhor nos deu neste mundo. É uma oração tão simples, mas que dá voz a tantos anseios que a nossa fé produz em nós. Ansiamos pela volta de Jesus, ansiamos pela salvação que ele traz e ansiamos por ser nutridos para fazer a obra que ele nos dá. Assim, terminamos a oração da melhor maneira: amém.

ORIGEM DA ORAÇÃO DA MESA
Sabemos que a Oração da Mesa é antiga, mais antiga que a nossa memória, mais antiga até que as pessoas de que nos lembramos da nossa infância. Mas quantos anos tem e quem o escreveu? Embora às vezes tenha sido atribuída a Martinho Lutero, a oração não é encontrada em nenhuma obra conhecida da era da Reforma.
Numerosos autores perceberam que a Oração da Mesa Comum é muito semelhante a partes de uma ária, uma composição musical escrita em 1669 por Johann Rudolph Ahle (1625-1673). Ahle foi o organista luterano e penúltimo antecessor de Johann Sebastian Bach em Mühlhausen, Alemanha. A oração parece derivar da primeira e terceira estrofes de sua ária. Mas... quando e por quem?
Há muito se pensa que a Oração da Mesa foi publicada pela primeira vez em Londres em 1753, em um hinário escrito pelo pietista radical alemão Nicolaus Ludwig Graf von Zinzendorf (1700-1760). Fundador e bispo da Igreja Moraviana (Brüdergemeine ), Zinzendorf foi um poeta e autor de muitos hinos. Baseando-se no seu hinário, muitos atribuíram a oração à Igreja Moraviana londrina ou a Zinzendorf em particular, situando a sua origem em Londres em 1753.
Novas pesquisas, entretanto, mostraram que a Oração da Mesa já era de fato amplamente conhecida em 1753. Sua primeira publicação conhecida foi em 1698, antes do nascimento de Zinzendorf.
A publicação mais antiga e conhecida da Oração da Mesa foi encontrada em um livro escolar escrito em Leipzig por Johann Conrad Quensen, filho de um pastor luterano, e intitulado Neues und Nützliches SchulBuch Vor Die Jugend Biß ins zehente oder zwölffte Jahr (“novo e útil livro escolar para jovens até décimo ou décimo segundo ano de idade”).

Publicação mais antiga conhecida da Oração da Mesa, no SchulBuch de Johann Conrad Quensen, março de 1698.
Johann Conrad Quensen é uma figura desconhecida na história. Seu pai era Conrad Quensen, que trabalhou como professor particular em Hannover e depois serviu como pastor luterano em Heersum (1661-1668) e Heinde (1668-1683), duas aldeias perto de Hildesheim. Quensen morreu no final do seu pastorado em Heinde. O filho Johann Conrad Quensen morou com sua mãe na casa das viúvas de pastor em Heinde.
Após estudos na Universidade de Helmstedt e na Universidade de Leipzig, ele exerceu atividades como autor deste livro escolar, de alguns poemas publicados entre 1694-1699, de vários livros sobre cálculo rápido 1701–1721, e de uma cartilha e um livro sobre moral cristã para os jovens em 1726.
 
Quensen escreveu a oração ou simplesmente a retirou de alguma outra fonte?
Ele provavelmente a escreveu em Leipzig para seu livro de 1698. O texto da ária de Ahle tinha acabado de ser republicado em Leipzig, menos de nove meses antes, em um hinário de oito volumes chamado Wagner Gesangbuch, uma obra mais tarde também usada por Johann Sebastian Bach. Quensen conhecia diversas pessoas envolvidas na publicação daquele volumoso hinário e certamente teve acesso a ele em Leipzig. Como nenhuma menção à oração é conhecida antes do livro escolar de Quensen, e porque o livro está tão intimamente associado no tempo, lugar e por conexões pessoais com o Hinoário Gesangbuch, parece provável que Quensen tenha usado o texto de Ahle do hinário para escrever novas orações para as crianças para pôr em seu próximo livro.
O livro escolar de Quensen obteve sucesso internacional imediato e ampla influência. Isto ocorreu em parte porque tratava de quatro assuntos (leitura, religião, latim e cortesia) em um volume que poderia poupar aos pais o custo e a inconveniência de comprar vários livros menores. Seu estilo de escrita e o uso de passagens da Bíblia e do Catecismo Menor de Lutero se adequavam bem ao público-alvo, que eram as crianças luteranas. A sua distribuição difundiu a oração, inicialmente através das escolas, depois, à medida que o seu público envelheceu, através da sociedade em geral. Ao longo do meio século seguinte, a oração tornou-se conhecida em todos os países de língua alemã e foi citada em mais de vinte outros livros antes de aparecer no hinário londrino de Zinzendorf.
Nossa amada Oração da Mesa foi escrita como uma oração para as crianças, sua piedade simples é suficiente para o propósito de educar os jovens em um contexto solidamente luterano, mas profunda em seu apelo à presença e às bênçãos de Cristo em nossas vidas. Agora sabemos que a oração não foi escrita em Londres em 1753, mas muito provavelmente em Leipzig em 1698. O seu autor é agora provisoriamente identificado como Johann Conrad Quensen, filho de um professor e pastor luterano, e com isso, podemos relembrar e celebrar os pelo menos 326 anos da nossa Oração da Mesa!

 

Artigo traduzido e adaptado por Rev. Filipe Schuamabach Lopes de “Come, Lord Jesus”, escrito pelo Rev. Dr. David W. Loy e publicado pela The Lutheran Witness (LCMS) disponível em https://witness.lcms.org/2011/come-lord-jesus-6-2011/ e “Who Wrote the Common Table Prayer?”, escrito pelo Rev. James R. Eggert e publicado pela publicado pela The Lutheran Witness (LCMS), disponível em https://witness.lcms.org/2024/who-wrote-the-common-table-prayer/. A citação da Bíblia Sagrada é da versão Nova Almeida Atualizada (NAA), da Sociedade Bíblica do Brasil.

Comments


SOBRE NÓS

Este website não tem como propósito impor qualquer forma de culto, mas, ao contrário, busca servir como um auxílio para aqueles que demonstram interesse na teologia do culto da Igreja Luterana.

  • Grey Facebook Icon
  • Grey Instagram Icon

© 2024 por Serviço Divino.

bottom of page